Artigo

Reforma Administrativa com foco na gestão de pessoas

Carlos Ari Sundfeld
é membro do Movimento Pessoas à Frente e professor na Fundação Getúlio Vargas (FGV SP).
Vera Monteiro
é presidente do Conselho do Movimento Pessoas à Frente e professora na Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP).
A
Carlos Ari Sundfeld
é membro do Movimento Pessoas à Frente e professor na Fundação Getúlio Vargas (FGV SP).
Vera Monteiro
é presidente do Conselho do Movimento Pessoas à Frente e professora na Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP).

A Reforma Administrativa com foco na gestão de pessoas precisa enfrentar os seguintes problemas centrais: falta de eficiência do serviço público para a população; e falta de igualdade entre as carreiras, com diferenças enormes quanto a remuneração e estímulos entre os regimes das categorias de elite (como juízes, promotores, defensores públicos, advogados públicos e auditores) e os agentes públicos que prestam serviços à população (nas áreas de saúde, educação, assistência social e segurança pública).

Para isso, a agenda a ser perseguida é:

a) acabar com promoções e progressões automáticas previstas nas leis de carreira, evitando-se chegar muito rápido ao topo;

b) corrigir distorções remuneratórias;

c) impedir penduricalhos;

d) modernizar concursos públicos, passando-se a medir competências e habilidades, que não são mensuráveis em prova objetiva;

e) extinguir carreiras obsoletas, racionalizando-as;

f) planejamento unificado da força de trabalho;

g) avaliar todos os servidores, inclusive aqueles em fase de experiência (estágio probatório);

h) incentivar a melhoria dos servidores estáveis que tenham desempenho insuficiente e, em caso de reiteração, fazer seu desligamento; e

i) viabilizar, nas situações adequadas, a utilização de agentes com contratos por tempo determinado ou em regime celetista.

Do ponto de vista da estratégia jurídica, a reforma administrativa deverá:

a) promover tanto mudanças no plano da gestão, por medidas infralegais (decretos), quanto, nas hipóteses necessárias, por meio de normas infraconstitucionais (leis ordinárias ou complementares), que são mais fáceis e efetivas do que alterações constitucionais;

b) não tem sentido a obsessão em mexer no regime constitucional dos servidores públicos efetivos (aqueles que fazem concurso e se tornam estáveis após três anos, e só existem nas administrações diretas e nas autarquias) – é um caminho difícil demais e, em muitos sentidos, inadequado, para, no curto ou médio prazo, perseguir eficiência administrativa e menores gastos;

c) não é preciso acabar com a estabilidade dos servidores para melhorar a gestão pública – o problema não está nela, mas nas confirmações, promoções e progressões automáticas ou por simples tempo de serviço, sem relação com a qualidade do serviço – e a melhoria dos serviços depende de estímulos ao bom desempenho e de avaliação permanente dos servidores, com elevações paulatinas nas carreiras, ao longo de toda a vida funcional;

d) segundo a Constituição, admissões de agentes públicos podem ser feitas tanto no regime estatutário (servidores públicos efetivos, que adquirem estabilidade após 3 anos), como em regimes que não propiciam a estabilidade: o temporário (por prazo determinado) e o da CLT (que pode ter ou não prazo determinado);

e) mesmo que, hoje, não seja tão ampla a competência constitucional para a União federal fazer leis com abrangência nacional em matéria funcional (pois, para muitos pontos, os entes subnacionais têm autonomia legislativa), há espaço para algumas leis estruturantes de caráter nacional que uniformizem ferramentas de gestão de pessoas. Nos demais casos, reformas podem começar pelo governo federal e, com algum estímulo da legislação federal, ser depois replicadas pelos entes subnacionais.

Para nós, faz sentido apoiar a imediata aplicação da lei federal 14.965/2024, com normas gerais sobre concursos públicos para toda a administração pública brasileira. Sua utilidade é trazer regramento mínimo para contribuir para a efetiva realização e modernização dos concursos em âmbito nacional, melhorando o recrutamento de novos servidores públicos pela avaliação dos postulantes com base nas reais capacidades para o efetivo desempenho das funções.

O desafio é a aplicação da nova lei, fazendo com que ela efetivamente atinja seu objetivo de melhorar o recrutamento de pessoas no setor público. Para isso, a ação necessária é o apoio à edição de regulamentos específicos pelas esferas federativas, capazes de dar segurança jurídica ao desenho do novos editais, bem como à realização de projetos pilotos de concursos mais modernos.

Apoiar o projeto de lei da Câmara dos Deputados 3.069/2025, que propõe a criação de uma lei geral de contratações de pessoas por tempo determinado no setor público, aplicável nas esferas federal, estadual e municipal, para uniformizar regras fundamentais, aumentando a segurança jurídica e corrigindo distorções nas contratações transitórias ou emergenciais.

A proposta tem origem em minuta de responsabilidade da Sociedade Brasileira de Direito Público, em trabalho liderado pelos professores da FGV Direito SP Carlos Ari Sundfeld e Vera Monteiro, com apoio do Movimento Pessoas à Frente e do Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração.

Esses vínculos temporários com o poder público já são autorizados pela Constituição (art. 37, IX), sendo usados largamente pelos entes subnacionais, onde mais da metade dos professores está hoje nessa modalidade. Esse tipo de vínculo não serve para todos os postos de trabalho (pois há casos que exigem o regime estatutário, como as atividades-fim reservadas às carreiras jurídicas, de fiscalização tributária, policial militar, polícia judiciária e de guarda municipal). Ele serve para suprir carências emergenciais de pessoal, bem como nos casos em que o meio ordinário de preenchimento de cargo público não se justifica, consideradas as circunstâncias atuais e futuras da atividade, como transitoriedade, rotatividade e mudança demográfica.

Apoiar a edição de medidas legais nacionais de caráter geral que impeçam a distorção e limitem o recebimento de verbas fora do teto constitucional de remuneração dos agentes públicos. Supersalários impactam a igualdade no setor público. São valores recebidos indevidamente acima do teto de remuneração estabelecido pela Constituição. Estão concentrados principalmente nas carreiras jurídicas (magistratura e ministério público, sobretudo), não sendo a realidade dos agentes públicos do Executivo (70% dos servidores públicos ganham até 5 mil por mês). 

Ainda devem entrar na discussão sobre reforma administrativa com foco na gestão de pessoas os seguintes temas, ainda sem propostas legislativas apresentadas:

a) rever o sistema de carreiras, são muitas carreiras, a grande maioria com promoções e progressões automáticas, sem referência à qualidade do serviço prestado;

b) regulamentar as políticas de atração, pré-seleção e gestão de cargos de liderança, incluindo o mapeamento e maior transparência na ocupação dos cargos comissionados;

c) aprimorar a transparência de informações e dados a respeito de servidores e lideranças públicas e unificar as informações;

d) edital lei complementar nacional para viabilizar a dispensa de servidor efetivo estável que tenha desempenho insuficiente;

e) e regulamentar a greve no setor público. 



Este conteúdo é fruto de uma parceria editorial com o Movimento Pessoas à Frente — uma organização suprapartidária e plural, composta por mais de 200 pessoas com diferentes perspectivas políticas, sociais e econômicas, comprometidas com o aprimoramento das políticas de gestão de pessoas no setor público. 

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.