A armadilha da renda média

28 de agosto de 2025

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Pelo 19º ano consecutivo, o Brasil permanecerá na faixa de renda média alta do Banco Mundial. Essa classificação tornou-se tanto um rótulo estatístico quanto um símbolo da estagnação econômica crônica.

A classificação mais recente do Banco Mundial estima a renda nacional bruta per capita do País em US$ 9,95 mil — muito abaixo do piso de US$ 13,85 mil que configura a faixa de alta renda. A Costa Rica, antes uma nação pobre da América Central, cruzou essa linha neste ano, com uma renda per capita de US$ 15,62 mil, ampliando uma distância que vem aumentando constantemente desde 2010.

Há 15 anos, a renda per capita brasileira era um terço maior que a da Costa Rica. Atualmente, o país centro-americano desfruta de uma vantagem de mais de 56%, impulsionada por políticas que expandiram o comércio, diversificaram a produção e fortaleceram o setor de Serviços. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), “dispositivos médicos e serviços empresariais ultrapassaram as commodities agrícolas e o turismo como as principais exportações do país”.

Ainda assim, como observa o economista brasileiro Pedro Nery, os índices de saneamento básico, desigualdade e educação da Costa Rica “não são muito melhores que os do Brasil”. Essa comparação aponta para um quebra-cabeça maior. “Os economistas esperam que uma melhor qualidade institucional crie um ambiente propício ao investimento”, afirma Carlos Alberto Ramos, professor de Economia na Universidade de Brasília (UnB). “No entanto, a ascensão econômica de países com condições sociais e institucionais semelhantes — e, às vezes, piores — às do Brasil questionou essa premissa”, sinaliza.

Ramos compara o Brasil com a Turquia, que quase alcançou a condição de país de alta renda em 2025, com US$ 13,15 mil per capita. De acordo com o professor, na maioria das variáveis normalmente associadas a crescimento e desenvolvimento — direitos de propriedade, independência judicial, autonomia do banco central, instituições políticas e percepção de corrupção —, o Brasil não tem desempenho pior que a Turquia, e em alguns casos é até melhor. “No entanto, essa melhor qualidade institucional não se traduz em melhor desempenho econômico”, observa.

Desaceleração estrutural

O Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2024 do Banco Mundial define a “armadilha da renda média” como uma desaceleração estrutural, que impede as economias de renda média de sustentar a transição para o status de alta renda. Dos 108 países de renda média — que abrigam três quartos da população mundial —, apenas 34 deram o salto para a renda alta desde o início da década de 1990. O Brasil está preso nela há décadas.

Segundo o economista Fernando Veloso, pesquisador no Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), os tropeços remontam à década de 1970, quando o País alcançou o nível de nação com renda média, mas tentou fomentar a inovação nacional sem, antes, dominar tecnologias similares às estrangeiras existentes. Esse atalho, aponta Veloso, falhou porque “as empresas não tinham capacidade tecnológica ou capital humano para inovar”.

Um exemplo emblemático foi o Programa de Inovação para Competitividade, de 2001, de incentivo aos desenvolvimentos científico e tecnológico brasileiros, com o objetivo de substituir tecnologia importada por soluções nacionais. O governo federal tributou o pagamento de royalties sobre tecnologias estrangeiras e redirecionou a receita para subsidiar projetos em biotecnologia, aviação, saúde e agricultura.

Um estudo do economista brasileiro Gustavo de Souza, pesquisador no Federal Reserve Bank of Chicago, constatou que o programa não obteve resultado positivo na qualidade dos produtos ou na adoção de equipamentos mais eficientes. Em vez disso, as empresas que se beneficiaram dos subsídios registraram perdas de empregos e um declínio na qualificação média dos trabalhadores. Aumentar a inovação em apenas 1 ponto porcentual (p.p.), estimou Souza, exigiria subsídios equivalentes a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) e, ainda assim, reduziria em 0,2% do PIB geral.

O Brasil já tentou caminhos semelhantes antes — principalmente na década de 1980, quando impôs uma reserva de mercado para computadores, proibindo importações e impondo regras de conteúdo local. O resultado, de acordo com um estudo acadêmico dos economistas Eduardo Luzio e Shane Greenstein, foi um mercado entre três e cinco anos atrás dos padrões globais, com preços mais altos e qualidade inferior à dos produtos provenientes dos Estados Unidos.

A lição, argumenta Veloso, é clara: “O Brasil deve facilitar a importação de tecnologias em vez de subsidiar a inovação nacional”. No entanto, a atual política industrial, lançada em 2023, corre o risco de repetir esses erros, especialmente com a pressão para desenvolver sistemas nacionais de Inteligência Artificial (IA).

Peso do câmbio

Um conjunto recente de gráficos publicados pela revista The Economist destaca a magnitude do desafio. Ajustado ao câmbio de mercado, o PIB per capita do Brasil é de cerca de US$ 10,3 mil por ano, o que, globalmente, situa o País na faixa de renda média baixa. Ajustado pelo poder de compra — que reflete os custos domésticos mais baixos —, o valor salta para US$ 22,3 mil.

Considerando as horas trabalhadas, o número sobe novamente para US$ 25,2 mil, já que os brasileiros trabalham mais horas do que pessoas em muitos países mais ricos. Esse ajuste coloca o País em uma posição ligeiramente melhor em comparação com a China — enquanto o PIB per capita chinês, a taxas de mercado, é de US$ 13,3 mil e, com base no poder de compra, de US$ 27,1 mil, o valor cai para US$ 19,2 mil quando se consideram as horas trabalhadas, sugerindo menor produtividade por hora.

O desempenho relativamente melhor do Brasil nesse quesito não é grande consolo. O País continua distante da produtividade e da capacidade de inovação das economias avançadas. Na visão de Veloso, a transição da renda baixa para a média depende da acumulação de capital e da adoção de tecnologias estrangeiras. Mas aproximar-se da fronteira da alta renda exige uma guinada em direção à inovação — e às instituições e políticas que possam sustentá-la.

Os países que escaparam da armadilha da renda média — incluindo Coreia do Sul, Polônia e Chile — tenderam a reduzir a intervenção estatal direta na produção e a adotar uma integração comercial mais profunda, estimulando a concorrência e os avanços tecnológicos. O Brasil, por outro lado, frequentemente reforçou políticas industriais protecionistas e introspectivas, protegendo os produtores nacionais da concorrência estrangeira, na esperança de que se inovassem. Essas apostas raramente deram resultado positivo.

Agora, alguns economistas afirmam que as tarifas de 50% impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre uma ampla gama de exportações brasileiras, podem representar uma dolorosa oportunidade para transformações. Brasília quer acelerar os esforços para diversificar os parceiros comerciais — uma mudança que também exigiria abertura mais ampla da economia e um aprofundamento da integração com outras regiões.

A publicação deste conteúdo é fruto de parceria entre a Revista Problemas Brasileiros e o portal The Brazilian Report. Acesse aqui o material original, em inglês.

The Brazilian Report Débora Faria
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