Educação tipo exportação

21 de março de 2024

Quando o maior evento de tecnologia para a educação reuniu milhares de pessoas no fim de janeiro, em Londres, um grupo de quase 200 pessoas era do Brasil. O número de participantes brasileiros tem crescido significativamente, segundo os organizadores da Bett Show. Nesse grupo bastante heterogêneo, havia secretários de Educação das redes públicas, diretores de escolas particulares, professores e, é claro, muitos empresários do setor educacional. Quase todos em busca de novas soluções e serviços para “importar” na volta para casa. No entanto, alguns pareciam seguir no sentido oposto: eram startups com planos de se internacionalizarem.

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Carolina Pavanelli, diretora pedagógica e sócia da Árvore, uma plataforma de soluções para aprendizagem, concorreu a uma premiação global para edtechs durante a Bett Show com a esperança de ganhar visibilidade além das fronteiras — e acabou vencendo na categoria de voto popular. Segundo ela, a vitória foi um momento entusiasmante, mas os planos de fechar negócios com o exterior ainda seguem em ritmo cauteloso. “Hoje, nosso mercado é brasileiro, mas, como muitas edtechs, a gente flerta com a ideia de explorar as Américas Latina e do Norte. O processo é longo, porque precisamos testar mercados. E é sempre bom conversar com outras empresas que já fizeram isso”, diz.

A Árvore nasceu há dez anos como plataforma de leitura. Contudo, atualmente, também oferece serviço para o aprendizado de inglês e um módulo para o desenvolvimento socioemocional. “Temos mais de 60 mil livros em língua portuguesa, 7 mil em inglês e, logo, vão entrar alguns em espanhol. Mais do que uma biblioteca digital, é uma experiência gamificada, porque quanto mais os alunos leem, mais acumulam pontos e conseguem construir a floresta deles”, explica.

De acordo com Carolina, o produto da Árvore “faz sentido” em quase todo o globo, porque estimular a leitura não é um desafio exclusivo dos professores brasileiros. “Atendemos à escola pública e à  privada. Nesses dez anos, já impactamos mais de 2 milhões de alunos. Claro que ainda há muito espaço para explorar no Brasil, mas isso não anula a outra parte: buscar oportunidades fora. O que a gente faz tem muito mercado onde quer que seja”, afirma.É relativamente fácil fazer o produto, em si, cruzar as fronteiras, por ser totalmente digital,. “Já traduzimos a plataforma toda para o inglês. Como não tenho um produto físico, sem dúvida, é mais fácil de exportar”, conta Carolina.

No entanto, os desafios na área educacional não são poucos: além do idioma, há questões culturais e de regulamentação. Ricardo Schneider, diretor da holding de investimentos Square Knowledge Ventures, recomenda que as empresas brasileiras da área comecem mesmo pela América Latina e tenham mente aberta para outros mercados do Sul Global, como África do Sul, Índia e Indonésia. “Os Estados Unidos têm uma dinâmica muito difícil: para entrar lá, é preciso convencer os boards de educação. É como participar de uma centena de reuniões de condomínio. A Europa é muito fragmentada, cada país com a própria língua e legislação”, pondera Schneider.

Uma das áreas profícuas para a exportação dos produtos educacionais nacionais é o ensino de inglês como língua estrangeira. A plataforma Geppetto é uma das que pretendem expandir as fronteiras. A primeira parceria internacional já vem sendo costurada na América Latina — a companhia está em conversas com escolas do Peru e da Argentina.“A empresa-mãe da Geppetto, a Manifesto Games, já nasceu internacional, com desenvolvimento de jogos. Faz cinco anos que desenvolvemos a Geppetto pensando na necessidade de ter LMS voltado para o público infantil. Se não for lúdico, divertido, próximo do que a criança já consome de games, ela não vai se engajar”, diz Vicente Vieira, CEO da plataforma.A proposta é ensinar inglês para crianças a partir de 3 anos até o fim da educação básica, em um ambiente digital. Mais uma vez, os gestores entendem que se trata de um produto útil a muitos países. “Contamos com pouco mais de mil escolas, com quase 200 mil alunos, espalhados pelo Brasil. Como o conteúdo é de inglês, faz muito sentido para todo o mundo, principalmente para países que não tenham o idioma como língua franca”, explica Vieira.

A visita à feira internacional, além de ser um momento propício para fechar negócios, é, antes de tudo, uma oportunidade para conhecer novos terrenos. “A ideia é explorar um pouco, conversar com algumas escolas, gestores e editores, para ver o fit do Geppetto em outros ambientes, ver se há necessidade de algum ajuste de currículo”, explica. O fato de ser uma plataforma para ensino de língua estrangeira facilita ainda mais a adaptação linguística. O sistema dispõe de uma parte de acesso e cadastro em português, e o professor pode deixar o dashboard na sua língua materna, mas, para o aluno, é tudo em inglês, o que pode facilitar o acesso em outros países, segundo o CEO.

A busca por mercados internacionais não significa que o nacional já foi suficientemente explorado. “Ainda tem muito espaço para crescer no Brasil, e nosso esforço comercial é com o foco no País, pois é um mercado gigante”, afirma Vieira. No entanto, para quem quer crescer de verdade, o ideal é nunca virar as costas para o que se passa no mundo. “Viajar a Londres é uma forma de validar o produto, ter no radar o desenvolvimento e melhorias, entender como abranger também novos mercados,  diz o CEO.

Luciana Alvarez Annima de Mattos
Luciana Alvarez Annima de Mattos
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