Uma sondagem da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) com o empresariado do varejo da cidade de São Paulo mostra que metade dos negócios sofreu algum tipo de impacto climático nos últimos 12 meses. No entanto, a pesquisa — que ouviu 200 empresas de pequeno e médio portes em abril de 2024 — sugere que uma parcela significativa dessas empresas ainda não reúne condições de enfrentar os desafios ambientais, que tendem a se agravar em um futuro próximo.
Isso acontece porque ainda há dificuldades de avaliar o retorno dos investimentos em ações relacionadas a efeitos climáticos, tanto no curto como no longo prazo. Esses negócios apenas espelham um desafio mais estrutural das economias globais. Mas não é só isso: faltam linhas de crédito especiais para gastos com a adoção de tecnologia para reduzir emissões, como painéis solares, assim como programas e políticas públicas para incentivar que empresas, sobretudo pequenas e médias, comecem a elaborar um planejamento ambiental adequado ao modelo de negócio.
Apesar disso, o número de empreendimentos com alguma medida em operação é relevante, pois sugere que já exista um certo movimento consolidado de tornar o ambiente empresarial mais sustentável.
Confira a, seguir, os principais dados da sondagem FecomercioSP.
Para o assessor da FecomercioSP Fábio Pina, o dado impressiona por mostrar o alto nível de exposição do varejo paulistano aos eventos climáticos. Na capital paulista, as chuvas e seus efeitos — como enchentes, enxurradas, queda de árvores e falta de energia — são o maior problema. Elas causam transtornos que vão desde a interrupção parcial (ou total) das atividades (13% das empresas ouvidas) até a perda de estoques e sinistros de veículos e mobiliário. “Somos muito menos potentes contra problemas da natureza do que imaginamos. Isso é um fato”, reforça.
Segundo o economista, porém, não é possível avaliar se houve piora ou melhora no dado, já que se trata de uma sondagem inédita. Considerando o momento da pesquisa, era ainda recente a lembrança dos frequentes apagões na cidade no início do ano, que acarretaram interrupções das atividades, em diversos casos, por mais de 24 horas.
“Uma em cada três empresas sofre financeiramente com problemas relacionados ao clima. É um número muito expressivo”, avalia Pina. “Nem a violência causa tantos prejuízos; não se encontra um dado que mostre que uma em cada três empresas foi roubada”, compara.
Ainda assim, de acordo com Pina, a maior parte dos prejuízos é pequena e contornável. No entanto, é preciso reforçar que, como a amostra inclui pequenos e médios negócios, a margem para absorver perdas se mostra baixa. São empresas que vivem “da mão para a boca” e, portanto, não contam com reservas financeiras relevantes para imprevistos ou capacidade de investimento em pacotes mais abrangentes de seguros para se protegerem.
Segundo Pina, investimentos em eficiência energética são os mais factíveis — e com retorno notável — para os empresários que compõem a amostra da sondagem. Trata-se de um setor com gastos elevados. A modernização do equipamento, por exemplo, além de reduzir a emissão de GEEs, traz benesses financeiras facilmente percebidas pelo empresário. “Iluminação adequada e temperatura ajustada para o fluxo de pessoas trazem efeitos rápidos. A percepção não é de custo, mas de um investimento que também oferece benefícios social e ambiental — inclusive, o empresário é um beneficiário direto”, explica o economista.
Outra frente é adotar soluções logísticas otimizadas, que reduzem, por exemplo, a quilometragem diária percorrida para a entrega de produtos. “Terceirizar a logística pode ser um meio do empresário economizar e também reduzir as emissões totais do seu negócio”, afirma.
Ele afirma ainda que mais informação faz o empresário perceber que os interesses social e ambiental também podem ser individuais. É importante, porém, novamente lembrar que há restrição de recursos, então, nem sempre investimentos maiores serão viáveis a pequenos e médios negócios. “Há muito o que fazer antes de imputar custo.”
Mesmo assim, a sondagem mostra que, dentre os empresários que pretendem investir em medidas para reduzir emissões, 37,5% se dizem “muito dispostos” a aportar recursos nessas iniciativas.
Na avaliação de Pina, o dado mostra que há um espaço importante de conscientização de que medidas adotadas em cada um dos negócios podem ser boas para a própria empresa. Um exemplo é a substituição de lâmpadas: num pequeno estabelecimento, pode ser um investimento relevante no ato, mas com retornos perceptíveis em poucos meses. Na logística, o retorno pode ser mais imediato, com economia real de combustível por meio da adoção de rotas mais assertivas. No entanto, mesmo medidas simples demandam o tempo do empresário para se informar e para que seja possível olha para o próprio negócio. Em empresas pequenas, esse recurso também é escasso.
Os dados apresentados até aqui mostram que o empresariado percebe a necessidade de ações para conter a crise climática e mitigar os seus efeitos, sentidos de forma importante pela maioria. Entretanto, entra na conta o custo dessas ações, muitas vezes não absorvíveis pelos orçamentos restritos dos pequenos e médios negócios. Há, ainda, uma percepção menos tangível: a do valor que essas ações agregam ao valor de produto para o consumidor. Nesse ponto, os entrevistados se dividem — 49% afirmam notar a preferência dos clientes por produtos e serviços associados à sustentabilidade, enquanto 51% percebem que essa ainda não é uma demanda da clientela
Esses resultados demonstram que, apesar de o tema ter crescido e fazer cada vez mais parte da decisão de compra do que há alguns anos, o fator “preço” ainda pode ser o mais importante na hora de ir às compras. A percepção do empresariado, assim, apenas comprova que há mais preocupação ambiental, mas não a ponto de transformar os padrões decisórios dos consumidores.
Na visão de Fabio Pina, é provável que parte da importância que as empresas enxergam no consumidor quando o assunto é sustentabilidade passa por estratégias de marketing, e não necessariamente por ações efetivas. “Muitas empresas ainda não fazem o básico, medidas que primeiro trariam retorno a elas próprias. É por aí que precisamos começar”, afirma. “Não podemos trazer exigências irreais para apavorar esse empresário, que podem até levar ao fechamento de empresas”, alerta o economista.
Ele lembra que a FecomercioSP dispõe de uma série de materiais informativos para orientar empresários dos setores de Comércio e Serviços sobre como melhorar a eficiência energética e adotar medidas de economia circular, por exemplo. E é fundamental trazer valor econômico para essas condutas. Ele lembra do sucesso que é a reciclagem do alumínio no Brasil — que chega a 95% segundo a Associação Brasileira dos Fabricantes de Lata de Alumínio (Abralatas). Isso acontece porque há toda uma cadeia de geração de negócios, empregos e renda em torno da reciclagem. “Criar valor econômico nessas práticas é o mais importante. É preciso mostrar para o empresário que há um valor intrínseco nessas atitudes, com benefícios social e ambiental — mas que, talvez, não seja perceptível para ele imediatamente”, explica.
Ainda de acordo com economista, o primeiro passo é informar o empresário a respeito de como essa cadeia de efeitos opera e como o interesse dele se alinha com o de toda a sociedade. “E é possível começar do básico. Menos destruição do meio ambiente é bom para todos, inclusive para os negócios”, conclui Pina.