Como você definiria o ano que passou? E o que imaginar para o que está chegando? Enquanto a humanidade é confrontada com a prevista — e agora real — crise climática, também observa a escalada das guerras, uma das suas mais antigas mazelas. No Oriente Médio, há décadas não se via tamanha violência, enquanto o conflito entre Rússia e Ucrânia entra no terceiro ano sem bandeira branca à vista. Um mundo que está em veloz transformação, capitaneada pelo avanço tecnológico que muda a vida das pessoas em diversas frentes, da economia ao dia a dia dos trabalhadores, das salas de aula ao campo. Transformação essa que muda também a estrutura do próprio tecido social, com desdobramentos ainda imprevisíveis.
Para organizar esses pensamentos, a Revista Problemas Brasileiros elegeu 25 palavras e expressões essenciais para entender 2025. Divididas em cinco temas – Política, Economia, Inovação, Sustentabilidade e Sociedade – a reportagem ouviu especialistas em cada em cada um deles. Com reflexão e intencionalidade, as várias pontas soltas do novelo podem ser encaradas como verdadeiras oportunidades para que a transformação em curso se traduza em avanço para todos.
Ao longo dos próximos dias traremos aqui para o site da PB cada um dos eixos analisados na reportagem, que faz parte da edição especial de fim de ano da Revista Problemas Brasileiros.
Confira abaixo as cinco palavras para pensar economia em 2025.
CONTAS PÚBLICAS
O crescimento da dívida pública vem perdendo força, com tendência para se estabilizar em 2026. No entanto, não há motivos de comemorar: ainda que estável, segue num patamar alto e deve ultrapassar os 80% do Produto Interno Bruto (PIB). A meta do governo é de déficit primário zero, com banda de flutuação de 0,25% do PIB. “Mas algumas despesas, ainda que primárias, como o socorro ao Rio Grande do Sul, não são contabilizadas no resultado. Na prática um orçamento equilibrado pode significar um déficit ao redor de R$ 55 bilhões”, explica Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Ainda é cedo para apontar certezas para 2025, pois um cenário de juros altos pode puxar a dívida para cima. Em compensação, um bom crescimento econômico eleva a arrecadação e ajuda no equilíbrio das contas. “Para 2026, cumprir a meta fiscal pode se revelar bem difícil por causa da eleição, um componente fiscal muito forte. A conjuntura não é confortável, mas temos um caminho”, avalia Pires.
COMPETITIVIDADE
O Brasil caiu para a 62ª posição no World Competitiveness Ranking de 2024, uma piora de seis posições em relação ao 56ª lugar de 2020, ano de início do estudo. Dentre 67 países, estamos à frente apenas de Peru, Nigéria, Gana, Argentina e Venezuela. O ranking, que analisa mais de 300 critérios, usa dados oficiais e pesquisas com empresários. Contudo, a perda de competitividade nacional é um processo gradual que já dura mais de 40 anos. Nos anos 1980, o País representava 4,3% do PIB mundial; hoje, esse número é de apenas 2,3%. Mas esse declínio é tão diverso quanto o próprio Brasil. “Há diferenças setoriais. O Agronegócio tem um dinâmica de produtividade — e, assim, vem se tornando mais competitivo — bem superior ao do restante da economia”, explica Antonio Lanzana, presidente do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Mudar o atual panorama exige um trabalho de melhoria em várias frentes, como infraestrutura, educação, distribuição de crédito e abertura internacional. “A diferença de escolaridade entre Brasil e Coreia explica em torno de 40% da diferença de produtividade entre os dois países”, cita Lanzana. Outro ponto de atenção é a necessidade de se aperfeiçoar o ambiente de negócios. “Temos um ambiente desfavorável aos investimentos, com dificuldades para abrir e fechar empresa e burocracias complicadas para cumprir as obrigações trabalhistas e tributárias”, ressalta.
COMÉRCIO EXTERIOR
Em 2023, o Brasil bateu um recorde histórico nas exportações, com superávit comercial próximo dos US$ 100 bilhões. À época, com o otimismo tomando conta do governo, o presidente da ApexBrasil, agência de promoção do comércio exterior brasileiro, Jorge Viana, chegou a prever um fluxo comercial de US$ 1 trilhão em 2024. Entretanto, à medida que os meses passavam, reformas prometidas não saíram do papel, negociações de acordos internacionais estagnaram e houve queda nas vendas de commodities. O resultado? Um superávit em 2024 abaixo do ano anterior — e ninguém mais toca no assunto do suposto US$ 1 trilhão.
A tendência para 2025 é de um arrefecimento ainda maior. “Esse US$ 1 trilhão foi um chute, não temos condições de chegar a esse valor no curto prazo. O comércio exterior brasileiro cresceu de 2000 para cá só em commodities, o que não é sustentável”, afirma José Augusto de Castro, presidente-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). O problema das commodities é a instabilidade, pois os preços dependem mais dos compradores do que da capacidade interna de produção. “A China compra 80% da soja brasileira. Quem define preço e decide o que fazer é o país asiático”, explica.
Ainda que o saldo da balança comercial siga no azul, o País deveria incentivar a exportação de manufaturados, que têm mais valor agregado, geram mais empregos e promovem crescimento interno. “No ano 2000, a balança comercial de manufaturados tinha déficit de US$ 5 bilhões, valor que aumenta a cada ano [US$ 128 bilhões em 2023] e vai continuar crescendo”, estima Castro.
INFRAESTRUTURA
O Brasil investe, hoje, menos de 2% do PIB em infraestrutura, enquanto a média mundial é de mais de 4%. O resultado é a deficiência crônica no setor. A lacuna fica evidente em setores como transportes rodoviário, portuário e ferroviário, além do digital, em que há carência especialmente na capacidade de transmissão de dados. Esse déficit é uma das causas do chamado Custo Brasil, valor extra para produzir no País que recai sobre as empresas e acaba distribuído aos consumidores. “O governo não tem capacidade financeira para realizar os investimentos necessários. O caminho é atrair o setor privado. Para isso, precisamos garantir estabilidades jurídica, política e macroeconômica”, afirma André Sacconato, economista e assessor da FecomercioSP.
Uma das fronteiras de incremento para a economia nacional, mas profundamente dependente de uma infraestrutura mais eficiente é o Turismo. Contudo, para alavancar o setor, é preciso investir em aeroportos, rodovias e ferrovias, além de segurança pública e educação. Esse déficit não se resolverá em um ano, mas é preciso dar os primeiros passos, com planejamento estratégico, regulação eficaz e estabilidades política e econômica.
INSEGURANÇA JURÍDICA
Um caso de repercussão internacional — o bloqueio das contas bancárias da Starlink para garantir o pagamento de multas da rede social X — marcou 2024 e levantou temores de que a Justiça relativize a autonomia patrimonial das empresas. E não se trata da única medida recente que causou inquietação nos agentes econômicos. Em outro caso, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a abertura de crédito extraordinário no orçamento para combater as queimadas, fora do arcabouço fiscal.
“Não cabe a um ministro do Supremo dizer: ‘Isto vai ficar fora do orçamento’. Arcabouço fiscal é matéria do Legislativo e do Executivo”, avalia Ives Gandra Martins, presidente do Conselho Superior de Direito da FecomercioSP. Esse tipo de decisão, na visão de Martins, é um desrespeito à separação de poderes prevista na Constituição. “O Supremo auto-outorgou o direito de legislar. Legislou no casamento de homossexuais, no Marco Temporal e nas drogas”, cita o professor de Direito.
Embora com boa intenção, as medidas afetam a confiança institucional. “Transformar o Supremo num poder político tem gerado intranquilidade e desfigura a própria imagem”, afirma Martins. Para voltar a ser uma instituição respeitada, os ministros devem deixar de lado o protagonismo político. “Minha esperança é que eles, percebendo a reação nacional contra essa invasão de competências, voltem a ser o Supremo de antigamente”, afirma. Mas o jurista ressalta: “há diversos pedidos de intervenção e de impeachment de ministros. Não não sou favorável a medidas dessa natureza”.